Escrito por Pedro Canto – Analista de Investimentos | CNPI-T da CM Capital
Quem ganha a briga?
Começo meu primeiro artigo aqui na plataforma com uma discussão antiga no Mercado Financeiro, principalmente na roda de analistas e investidores. Afinal, qual a melhor escolha na hora de analisar e fazer um investimento?
Para tentar responder a esta pergunta, vou utilizar uma analogia:
Qual ferramenta é melhor? Um martelo ou um serrote?
Temos como saber, de antemão, qual a melhor ferramenta sem nem ao menos saber onde ou para qual trabalho vamos utilizá-la? Obviamente que não! Incorremos no risco de escolhermos um pincel de aquarela para pintar a fachada de um edifício.
Portanto, a resposta correta para a pergunta é: depende!
Assim como o martelo e o serrote, a análise técnica e a análise fundamentalista também são ferramentas de trabalho. Ferramentas estas que nos auxiliam na análise de investimentos.
E, assim como as ferramentas de trabalho, ambas as escolas de análise possuem características e propósitos diferentes. E são estas características que irão nos dizer em que situações e para quais objetivos as ferramentas serão melhor utilizadas.
Perguntas como: perfil de risco e do investidor, horizonte temporal de investimentos, tempo disponível para acompanhar os investimentos e, até mesmo, gosto pessoal, são questões a serem levadas em consideração na escolha de qual técnica de análise escolher. No fim das contas, a escolha está muito mais ligada ao investidor do que ao Mercado.
E aqui cabe uma ressalva. Até aqui posso ter passado a impressão de que ambas as escolas são excludentes. Pelo contrário! Ambas as técnicas são complementares e podem (devem) ser utilizadas em conjunto.
Feita esta breve introdução, vamos agora entender a filosofia e os métodos de cada tipo de análise para, ao final do artigo, sermos capazes de ponderar os benefícios e pontos fracos de cada uma. Assim, você investidor, poderá escolher qual ferramenta utilizar em seus investimentos.
Antes de prosseguir gostaria de fazer uma ressalva. O assunto de ambas as escolas de análise é bem profundo, não conseguiria expor em um simples artigo as nuances de cada uma. Tentei ser o mais sucinto e direto possível, portanto, para os mais aprofundados no assunto, pode parecer um artigo um pouco superficial e impreciso, até injusto com alguma escola de análise. Definitivamente não é a intenção. Em artigos futuros podemos nos aprofundar mais nas nuances de cada uma.
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Olhando o passado para projetar o futuro
O futuro, bem… Está no futuro. Não temos como prever com precisão o que acontecerá mais à frente. Entretanto, podemos estimar – utilizando estatística, premissas e projeções – qual o caminho mais provável de se materializar, dentre uma gama de possíveis caminhos futuros.
Portanto, quando analisamos um potencial investimento olhamos para o passado para tentar projetar o futuro. Tendemos a acreditar que o que aconteceu no passado, tenderá a se repetir no futuro.
Até mesmo conceitos básicos de finanças e gestão de carteiras utilizam este critério. O modo clássico de se calcular o retorno esperado e o risco de uma ação é olhar o seu passado. Calculamos a média dos retornos passados para projetarmos os retornos futuros (esperados) de uma ação; e calculamos o desvio-padrão dos retornos passados para estimarmos qual o risco deste ativo financeiro. Depois, calculamos a correlação histórica entre os ativos e podemos montar um portfólio eficiente utilizando a teoria clássica de Markowitz.
Olhamos o passado para montar uma carteira de investimentos para o futuro. Esperando que, o que ocorreu no passado, irá se repetir no futuro.
Aqui não quero entrar no mérito se esta abordagem está certa ou não. Podemos deixar para um outro artigo futuro o debate sobre se o risco de um ativo pode ser medido pela sua volatilidade histórica (desvio-padrão dos seus retornos).
Agora que vimos de que forma estimamos os riscos e retornos de um ativo financeiro, vamos nos aprofundar em qual técnica cada escola de análise utiliza para chegar em um mesmo objetivo: estimar o retorno futuro de um investimento.
Análise Fundamentalista
A Análise Fundamentalista, como o nome sugere, analisa os fundamentos do ativo (no caso de uma ação os fundamentos da empresa) para a tomada de decisão.
Balanço Patrimonial, DRE (Demonstração do Resultado do Exercício), conversa com fornecedores, clientes e management, pesquisa de mercado e concorrentes… Todos estes itens e, alguns mais, são levados em consideração na etapa de análise. Se pudesse resumir em poucas palavras (com o risco de soar superficial e impreciso) diria que se trata de uma Análise Qualitativa, pois estamos preocupados em nos tornarmos sócios por um bom tempo desta empresa.
Da ótica clássica o objetivo é determinar o valuation do ativo. Com ele em mãos, comparamos o seu valor com o valor atual de mercado.
Temos 2 instrumentais clássicos para determinar o valuation de uma empresa:
- Fluxo de Caixa Descontado (DCF em inglês);
- Múltiplos.
Se eu me aprofundar no método de cálculo do DCF, este artigo (que já é extenso) ficará ainda maior. Entretanto, acredito que o cerne do método foi entendido: olhar o passado para projetar o futuro.
No DCF em específico, o analista olha para o Balanço Patrimonial e DRE dos últimos trimestres (lembrando que a divulgação de DRE de S.A. abertas é feito trimestralmente) e projeta para o futuro as receitas, custos e despesas de hoje até o infinito. Posteriormente traz estes fluxos de caixa a valor presente utilizando uma taxa de desconto.
Eu sei, parece um pouco técnico. Mas, resumidamente, olha-se para as receitas, custos e despesas atuais; estima-se quanto elas irão crescer/diminuir no futuro e, utilizando conceitos de matemática financeira, traz-se estes valores futuros a valor presente (aplicação prática do VPL [Valor Presente Líquido]).
Feitos todos estes cálculos temos o chamado Valor Intrínseco (valuation) de determinada empresa. Então, comparamos o valor encontrado com o valor atual do mercado. Se o valor de mercado for inferior ao valuation calculado, compra! Se o valor de mercado for superior ao valuation calculado, venda! Quanto maior esta discrepância entre os valores, maior a oportunidade de ganhos (tornando curta uma história longa).
Análise Técnica
A Análise Técnica, diferentemente da Fundamentalista, não está preocupada com os fundamentos do ativo. Ela se preocupa única e exclusivamente com o seu preço.
Balanço Patrimonial, DRE, notícias… Nada disso importa! O Analista Técnico está preocupado unicamente com o gráfico de preços. O motivo disso é um dos pilares da Análise Técnica, a Teoria de Dow, a qual preconiza que os preços descontam tudo! Ou seja, todas as informações a respeito daquele ativo já estão incorporadas ao seu preço.
Em outras palavras, o gráfico de preços já reflete todas as informações disponíveis.
Novamente, sob o risco de soar superficial e impreciso, diria que se trata de uma Análise Quantitativa. Não estamos preocupados com a qualidade daquela empresa e nem queremos nos tornar sócios dela. Apenas estamos interessados em especular em cima dos seus preços.
Como já dei o spoiler, a principal ferramenta da Análise Técnica é o gráfico de preços. Aqui também olhamos para o passado para tentar “prever” qual será o futuro. Porém, ao invés de olharmos para receitas, custos e despesas; analisamos padrões de comportamento, expressos em padrões nos gráficos. Estes padrões tendem a se repetir ao longo do tempo. E, sabendo de antemão, qual o movimento futuro mais provável após a ocorrência de tal padrão (baseado em estatística), podemos tomar uma decisão de investimento baseado nesta informação.
Neste tipo de análise não temos utilização de matemática financeira, nem a necessidade de estimarmos fluxos de caixa futuros. À primeira vista pode até parecer uma análise mais simples e superficial. Entretanto, temos muita estatística e estudo de probabilidades envolvidas neste tipo de análise.
Por se tratar de identificação visual, este tipo de análise exige uma maior aptidão (que vem com a experiência) na identificação de padrões. Em um primeiro momento o gráfico parece confuso e nenhum tipo de informação pode ser extraída dele. Porém, com o tempo, os padrões se tornam muito claros e o analista consegue captar qual a “história” o movimento de preços está contando e, assim, estimar qual a maior probabilidade da direção dos próximos movimentos: para cima ou para baixo.
Qual a melhor escolha?
Agora que vimos, superficialmente, como funciona cada tipo de análise, podemos partir para a etapa final e determinar quais os pontos fortes e fracos de cada uma. Assim, podemos fazer uma escolha mais assertiva de qual método utilizar em nossos investimentos.
Análise Fundamentalista
Pontos Fortes
- Gera maior ancoragem, ou seja, menos suscetível a ruídos e notícias de curto prazo;
- Baixa necessidade de constante monitoramento do mercado e das posições em aberto;
- Filosofia de investimento mais alinhada à investidores institucionais;
- Pode ser utilizada tanto como estratégia para ganho de capital quanto de renda (dividendos).
Pontos Fracos
- Necessidade de conhecimento aprofundado da empresa e setor analisados (no caso de optar por não investir em Fundos de Investimento);
- Necessidade de adaptação do modelo para setores específicos (exemplo techs);
- Necessidade de conhecimento de matemática financeira;
- Grande dispêndio de tempo e coleta de informações;
- Grande sensibilidade à subjetividade do Analista, principalmente no tocante à Taxa de Crescimento da Perpetuidade (g) e Custo de Capital (WACC);
- Necessidade de constante atualização do modelo;
- Grande susceptibilidade à ocorrência de Cisnes Negros;
- Tempo maior para convergência do preço de tela para o valuation encontrado.
Análise Técnica
Pontos Fortes
- Baixa dispêndio de tempo e coleta de informações;
- Não exige conhecimento específico de modelos de negócio das empresas, dos setores analisados e de matemática financeira (entretanto friso a importância do investidor possuir estes conhecimentos, além de macroeconomia, para melhorar ainda mais a assertividade das operações);
- Grande versatilidade (pode ser utilizada para diversos ativos e classes de ativos);
- Conceito universal (ao analisar o gráfico de uma Petrobras ou de uma Apple, a interpretação é a mesma; agora analisar o DCF de uma Petrobras e de uma Apple é completamente diferente);
- Excelente para determinar o timing de entrada e saída de posições;
- Método facilmente rastreável, ou seja, é relativamente fácil criar estatísticas, gerar track-record e rodar backtests;
- Em comparação com o método de DCF, é mais fácil programar algoritmos de execução.
Pontos Fracos
- Se utilizado gráficos muito curtos, altamente suscetível a ruídos e notícias de curto prazo, ocasionando overtrading;
- Dependendo do horizonte temporal adotado, necessidade de constante monitoramento do mercado e posições em aberto (daytrade);
- Grande sensibilidade à subjetividade do Analista, principalmente no tocante à identificação e validação dos padrões gráficos;
- Grande dependência do timing correto na entrada e saída das operações (inviável para grandes posições e investidores institucionais);
- Não é ideal para construção patrimonial (particularmente acho difícil construir patrimônio com esta técnica, acho muito mais viável o investidor já possuir um certo capital e utilizar a Analise Técnica para rentabilizá-lo);
- Estratégia mais alinhada à especulação (honestamente não sei se isto é um ponto positivo ou negativo).
Assim, deixo aqui o meu parecer.
Para o investidor sem muito tempo para monitorar os seus investimentos, preocupado com a construção patrimonial no longo prazo e avesso à especulação; acredito que a Análise Fundamentalista estaria mais alinhada à seus interesses. Apesar de exigir conhecimentos de matemática financeira e conhecimentos específicos do setor analisado, podemos contornar este problema ao delegar estas tarefas a um time de profissionais, aportando em Fundos de Investimento.
Para o investidor com mais tempo para monitorar os seus investimentos, mais voltado para resultados de curto e médio prazo e entusiasta da especulação; recomendaria a Análise Técnica. Entretanto, aqui entram conhecimentos específicos de plataformas e agilidade operacional.
Porém, podemos ir por uma terceira via também. Combinando ambas as técnicas. O investidor pode muito bem ter uma alocação estratégica, visando o longo prazo e olhando para os fundamentos das empresas; e ao, mesmo tempo, destinar um percentual da carteira para alocações táticas, visando oportunidades pontuais no curto prazo, se aproveitando do market timing e dos ciclos de mercado.
A escolha da ferramenta está muito mais ligada ao investidor em si do que ao Mercado. Não existe melhor ou pior, existe o que se adequa melhor ao seu perfil e objetivos. Portanto, antes de iniciar os investimentos, procure se conhecer melhor e listar quais são os seus objetivos e necessidades.
Um grande abraço!